quinta-feira, dezembro 05, 2013

"Se não andei mal em salvar os judeus das garras do anti-Cristo, faça-me Vossa Eminência a caridade de mo dizer..."

As cópias de 2 cartas aflitivas escritas em 1946 e enviadas por Aristides de Sousa Mendes ao papa Pio XII, o chamado "papa do Holocausto", foram agora descobertas por um dos netos do grande herói português, e enviadas ao actual papa.
Ostracizado pelo ditador Salazar, o ex-cônsul em Bordéus que salvou a vida a cerca de 30 mil refugiados, concedendo-lhes os vistos que lhes permitiram a passagem para Portugal e daí para os EUA, Brasil, etc., morreu na miséria, completamente esquecido e abandonado pelas autoridades que governavam Portugal naquela altura, mas pior ainda pela "santa" Igreja Católica Romana, que simplesmente ignorou os apelos desesperados do maior herói da História de Portugal.
Nas duas cartas cujas cópias foram agora encontradas, Aristides de Sousa Mendes apelava ao papa, justificando o seu acto, com o desejo de "...procurar salvar aquela gente, cujas vidas dependiam essencialmente de mim, em momento tão trágico (...) era preciso desobedecer às instruções mais que draconianas que recebi? Embora. Mas cumpria a lei de Cristo..."

CARTA DE 10 DE MAIO DE 1946
Na carta de 10 de Maio, o herói português lamentava ao papa a sua "sorte", com estas palavras textuais: "...logo que foi conhecida em Lisboa a minha ousadia, fui destituído do meu posto e severamente castigado por Salazar para satisfação da disciplina e, como ele próprio declarou, duma reclamação de Hitler, o anti-Cristo..."
SALAZAR DEIXOU A FAMÍLIA DE ARISTIDES NA MISÉRIA
E o lamento prossegue: "...reduziu-me (Salazar) a mim e à minha numerosa família à mais cruciante miséria (...) como se eu, ao contrário da digna atitude que tive para com os refugiados, fosse apenas um criminoso de guerra..."
E Aristides aponta o dedo aos implicados neste verdadeiro "crime" de omissão: "Tudo o que narro é conhecido de Sua Eminência o Senhor Cardeal Patriarca e de Sua Excelência O Núncio de Sua Santidade (...)"
Este herói, vítima de uma das maiores e mais atrozes injustiças dos ditador Salazar, pergunta então: "(...) não há remédio a uma situação destas? Não haverá maneira de fazer justiça a quem não duvidou sacrificar-se (...) provocando os aplausos gerais pela sua atitude humanitária e acolhedora?"
Dirigindo-se ao papa Pio XII, que para Aristides, católico convicto representava "Cristo na terra", ele escreve: "Sua Santidade representa Cristo na terra; é a Ele que devo dirigir-me (...)"

"CRISTO NA TERRA?"
Pobre Aristides, acreditando estar a dirigir a carta ao "representante de Cristo", mal sabia que estava dirigindo o seu clamor ao representante do iníquo, do próprio Satanás, completamente indiferente e desinteressado dos gritos aflitivos dos milhares de judeus que diariamente eram incinerados nos campos de morte nazis. Pio XII, cuja imagem alguns tentam limpar a todo o custo, não foi mais do que um aliado de Hitler, quem sabe até intimamente contente com a erradicação selectiva daqueles a quem a sua pérfida e macabra instituição - a Igreja Católica Romana - perseguiu e assassinou durante séculos sob a acusação de serem os "autores da morte de Cristo."
E acreditando na boa vontade de Pio XII, o cônsul português pede misericórdia a quem infelizmente não tem disposição para a conceder: "(...) misericórdia para quem não quis senão cumprir as palavras divinas e assim foi favorável aos judeus por amor a Jesus Cristo."

CARTA DE 12 DE JUNHO DE 1946
Numa segunda carta escrita em 12 de Junho e enviada também à chefia católica, Aristides lamenta-se desta forma comovente: "Há muito que espero que uma palavra de Vossa Eminência possa consolar o meu coração inquieto, mas essa palavra ainda não chegou."
E continuou: "Há muito perdi a confiança na justiça terrena, não, porém, na justiça divina (...)"
Aristides perguntava ainda "Se não andei mal em salvar os judeus das garras do anti-Cristo, faça-me Vossa Eminência a caridade de mo dizer...para que eu possa proclamar aos meus filhos o bem e a justiça da minha conduta para que eles possam orgulhar-se de seu pai que só quis cumprir a lei de Deus e seguir a sua consciência, como sempre."

Aristides morreu em 1954, em grande miséria, sem nunca lhe ter sido feita justiça, nem ter sido reintegrado na carreira diplomática da qual foi demitido pelo "crime" de desobediência a um tirano, um déspota chamado Salazar, que se dizia católico, mas que de cristão certamente nada tinha. 
PAPA PIO XII E HITLER
Mas pior ainda do que a injustiça política e estadual, foi o silêncio demasiado "ruidoso" que recebeu da parte daqueles de quem esperava uma palavra amiga, um gesto de caridade, um esforço para a reposição da justiça. 
Esses, a Cúria Romana e o seu representante máximo, o papa Pio XII, foram os principais culpados deste crime. 

Bem haja Aristides de Sousa Mendes!
Shalom!





Sem comentários: